3i/ATLAS é o terceiro objeto interestelar confirmado a visitar o Sistema Solar e, até o momento, o mais volumoso de que se tem notícia. Imagens recentes obtidas pelo James Webb Space Telescope (JWST) e por telescópios terrestres, associadas a dados espectroscópicos, permitem traçar um retrato preliminar do visitante que desperta curiosidade em todo o meio astronômico.
Origem e natureza do objeto
Os cálculos orbitais indicam que 3i/ATLAS percorre uma órbita hiperbólica, velocidade e trajetória incompatíveis com um corpo oriundo da Nuvem de Oort. A assinatura orbital demonstra que o objeto se desloca a cerca de 137 000 milhas por hora (aproximadamente 61 km/s), ritmo superior ao que seria produzido unicamente pela atração solar sobre corpos ligados gravitacionalmente ao Sistema Solar.
A inclinação do Sistema Solar em relação ao plano galáctico — estimada em 60 – 62 graus — permite que objetos do disco espesso da Via Láctea atravessem a eclíptica. Modelos dinâmicos apontam que 3i/ATLAS segue justamente essa rota, vinda da região de alta densidade de poeira e gelo que compõe o disco galáctico, ambiente que pode ter favorecido o acúmulo de material durante bilhões de anos.
Tamanho estimado
Definir dimensões absolutas para 3i/ATLAS permanece um desafio, porque o núcleo está envolto por uma densa coma resultante de desgaseificação. A partir de medições de brilho e modelagem de refletância, astrônomos estimam um diâmetro que varia de 0,2 milha (cerca de 320 m) a 28,5 milhas (aproximadamente 46 km). As estimativas atuais, condicionadas pela intensidade de emissão de gás e poeira, aproximam-se do intervalo superior dessa faixa, sugerindo um objeto potencialmente maior que ‘Oumuamua (2017) e Borisov (2019), os dois primeiros visitantes interestelares catalogados.
Composição química
Amostragens espectrais do material ejetado revelam predominância de dióxido de carbono (CO₂), presença de gelo de água, vapor d’água e monóxido de carbono (CO). Detectou-se ainda sulfeto de carbonila (COS) e cianogênio (C2N2). A combinação do cianogênio com compostos de carbono explica o brilho esverdeado observado em alguns registros. Esses componentes reforçam a classificação do objeto como cometa de origem interestelar, sem qualquer indicação de natureza artificial.
Idade provável
Considerando a região de procedência — o disco espesso da galáxia — e a velocidade relativa em relação ao Sol, pesquisadores estimam que 3i/ATLAS possa ter cerca de 7 bilhões de anos, idade superior à do Sistema Solar, que se formou há aproximadamente 4,6 bilhões de anos. A longevidade sugere que o cometa viajou por uma fração relevante da Via Láctea antes de ser captado pelos instrumentos terrestres e espaciais.
Velocidade e classificação orbital
O valor de 61 km/s, medido quando o objeto ainda se encontrava a grande distância, excede o limite teórico esperado para corpos oriundos da Nuvem de Oort. O parâmetro excedente de velocidade (excentricidade > 1) confirma a trajetória hiperbólica e a classificação como visitante interestelar. Essa condição também significa que 3i/ATLAS não ficará gravitacionalmente retido pelo Sol e, após a passagem, retomará percurso rumo ao espaço interestelar.
Trajetória dentro do Sistema Solar
Por cruzar a eclíptica em um ângulo relativamente baixo, 3i/ATLAS realizará aproximações moderadas a alguns planetas:
- Marte — aproximação mínima ocorreu em 3 de outubro de 2025, a cerca de 18 milhões de milhas.
- Vênus — passagem mais próxima prevista para 3 de novembro de 2025, a distância de 60 milhões de milhas.
- Terra — o ponto de maior proximidade será em 19 de dezembro de 2025, quando o objeto estará a aproximadamente 170 milhões de milhas do planeta, valor ligeiramente inferior à distância média entre a Terra e Marte.
- Júpiter — encontro mais próximo esperado para 16 de março de 2026, encerrando a fase de interação significativa com o Sistema Solar.
As simulações confirmam que nenhuma dessas passagens representa risco de colisão. A trajetória hiperbólica garante que a gravidade solar e a dos planetas não conseguirão capturar o cometa.
Imagens obtidas
Duas fontes visuais compõem o registro mais fidedigno de 3i/ATLAS até o momento:
- James Webb Space Telescope — localizado a cerca de 1 milhão de milhas da Terra, na órbita de Lagrange L2, o observatório obtém imagens de alta resolução no infravermelho. A fotografia divulgada mostra o objeto como uma mancha difusa, resultado do brilho da coma e da pequena dimensão angular do núcleo. Não foram observados contornos regulares, detalhes de superfície ou estruturas artificiais.
- Tecnologia terrestre — o sistema SkyTour LiveStream, instalado em Benson, Arizona, capturou o cometa em modo de longa exposição. A imagem evidencia uma fonte luminosa tênue no interior de um retângulo de marcação, reforçando a dificuldade de resolução do núcleo por instrumentos baseados no solo.
Ainda que limitadas, essas fotos representam o material observacional mais fiel ao objeto; quaisquer representações que exibam formas regulares ou naves imaginárias têm natureza artística ou gerada por inteligência artificial.

Imagem: Internet
Diferenciação entre corpo natural e artefato
As características coletadas — espectro de emissão, perda de gás, presença de cauda e ausência de estruturas geométricas — são compatíveis com a de um cometa originário de regiões externas da galáxia. Não há evidência de propulsão ativa, sinal de radar controlado ou alterações súbitas de velocidade que indiquem manobra deliberada. Além disso, a composição rica em voláteis é típica de corpos congelados formados longe de estrelas, reforçando o diagnóstico de corpo celeste natural.
Contexto comparativo
O primeiro visitante interestelar detectado, 1i/‘Oumuamua, atravessou o Sistema Solar em 2017, apresentando formato alongado, ausência de cauda pronunciada e comprimento estimado em algumas centenas de metros. Dois anos depois, o cometa 2i/Borisov chegou com características mais “clássicas”, incluindo exibição de coma e cauda bem definidas. 3i/ATLAS mantém o aspecto típico de cometas, mas chama atenção pelo possível diâmetro de dezenas de quilômetros, dimensão poucas vezes observada mesmo entre cometas ligados gravitacionalmente ao Sol.
Próximos passos observacionais
À medida que o cometa se desloca em direção à parte interna do Sistema Solar, a atividade de desgaseificação tende a aumentar, ampliando a luminosidade e permitindo:
- Refinar estimativa de tamanho do núcleo por meio de modelagem fotométrica;
- Detalhar variação de abundância molecular na coma, lançando luz sobre processos de formação em ambientes interestelares;
- Monitorar possíveis fragmentações ocasionadas por tensões térmicas;
- Precisar desvios na trajetória, influenciados por eventos de ejeção de material.
Observatórios ópticos, infravermelhos e de rádio continuarão acompanhando o objeto até o distanciamento pós-março de 2026, quando o brilho diminuirá abaixo do limiar de detecção da maioria dos instrumentos.
Relevância científica
Objetos interestelares são oportunidades únicas de análise de matéria formada fora do Sistema Solar. A composição de 3i/ATLAS pode esclarecer diferenças na proporção de voláteis e compostos orgânicos em relação a cometas nativos, contribuindo para modelos de evolução química da galáxia. A eventual detecção de isótopos ou moléculas raras também serviria de indicador da diversidade de ambientes de formação planetária.
O que permanece indefinido
Mesmo com avanços recentes, alguns aspectos continuarão sem resposta definitiva até que novas medições sejam concluídas:
- Dimensão exata do núcleo — depende da dissipação parcial da coma e de observações detalhadas em várias faixas de comprimento de onda;
- Taxas de rotação — a variabilidade de brilho pode indicar período rotacional e orientação dos eixos;
- Proveniência precisa dentro do disco galáctico — a trajetória retrocalculada pode apontar região original, mas perturbações gravitacionais acumuladas ao longo de bilhões de anos tornam a tarefa complexa;
- Possíveis fragmentações futuras — tensões internas podem fraturar o núcleo à medida que o cometa se aproxima do Sol.
Situação de risco
Todos os cenários de aproximação elaborados até o momento afastam a hipótese de impacto com qualquer planeta. A menor distância prevista em relação à Terra, de 170 milhões de milhas, garante ampla margem de segurança. Mesmo a interação gravitacional com Júpiter não é suficiente para aprisionar o visitante.
Conclusão provisória
3i/ATLAS representa mais um marco na incipiente, porém promissora, era da astronomia interestelar. As primeiras análises confirmam que se trata de um corpo natural extremamente antigo, rico em voláteis, viajando em trajetória hiperbólica. A raridade de objetos desse tipo reforça a importância de campanhas de monitoramento intensivo até 2026, quando o cometa deixará a zona de observação privilegiada dos telescópios terrestres e espaciais.





















